Nesta semana, o Prêmio Shell de Teatro, uma das mais tradicionais premiações da cena teatral brasileira, anunciou os indicados cariocas do primeiro semestre para sua 28ª edição. Na categoria “Inovação”, uma das indicadas é a peça “O Processo”, concebida pelos petropolitanos Luiz Antonio Ribeiro e Leandro Romano.
Como no romance de Kafka, o protagonista Joseph K. é detido sem saber os motivos pelos quais foi acusado e precisa se defender mesmo sem saber como; na peça da companhia Teatro Voador Não Identificado, o ator que interpreta K. entra em cena sem nunca ter ensaiado e sem nunca ter visto o espetáculo. Para isso, a cada apresentação, um novo ator foi convidado para representá-lo ao lado do elenco fixo, mesmos sem saber como.
De acordo com os petropolitanos, o processo (sem trocadilhos) de criação foi árduo – “Criamos uma dramaturgia sem um personagem principal, ensaiamos uma peça sem esse personagem, os atores dialogavam com hipóteses, até que tudo foi ganhando forma e se tornando esse jogo ao mesmo tempo rígido e fluido que as pessoas podem ver na peça. Costumamos dizer que não fazemos ensaios, mas treinamos essa peça. Talvez por isso não seja possível diferenciar dramaturgia de direção, interpretação etc. É tudo muito misturado: uma coisa sempre contamina a outra”, explica Leandro Romano, que também é diretor do espetáculo.
Já a ideia de escolher justamente esta obra de Kafka surgiu em uma conversa entre os dois – “Um dia estávamos conversando sobre teatro e o Leandro falou que achava que tinha algo de interessante nesse livro, mas não sabia exatamente o quê. Continuamos a falar sobre o assunto até que a ideia apareceu. Então percebemos que ‘O Processo’ tinha tudo a ver com aquilo que a gente gostaria de pesquisar e falar”, conta Luiz Ribeiro, que assina a dramaturgia da peça.
A 1ª temporada do espetáculo ocorreu na Sede das Cias, no Rio de Janeiro, e teve como atores convidados: Alcemar Vieira, Bernardo Marinho, Charles Fricks, Fábio Porchat, George Sauma, Gregorio Duvivier, João Pedro Zappa, João Rodrigo Ostrower, João Velho, Johnny Massaro, Leandro Soares, Márcio Vito, Maria Eduarda, Pedro Henrique Monteiro, Renato Linhares e Pablo Sanábio. Já a segunda, no Teatro Ipanema, com Armando Babaioff, Eduardo Moscovis, Julio Adrião, Mateus Solano e Rafael Infante.
Todos os convidados se mostraram bastante empolgados com a ideia e aceitaram o convite logo de cara. “Isso pra gente foi surpreendente e motivador. No decorrer da temporada, a gente percebia que a proposta se realizava muito bem e de formas muito distintas. Ao mesmo tempo em que eles ficavam muito felizes em fazer, eram muito tocados pela experiência que eles tinham em cena, muitas vezes difícil. De alguma maneira, interpretar um personagem de Kafka, sem ensaiar, é sempre um desafio. Quanto ao público, costumamos dizer sempre que assistir ao espetáculo é como se fosse uma partida de futebol: não se sabe qual será o resultado, mas querem ver o que acontece no jogo, é uma espécie de torcida mesmo. Uma coisa interessante é que boa parte dos espectadores voltou para assistir, duas, três, quatro vezes…”, relata Leandro.
Uma proposta inovadora com uma acolhida tão grande não só por parte dos convidados, como também do público, culminou na nomeação ao Prêmio Shell de Teatro, a primeira do grupo. “Ficamos muito felizes. Embora a gente sempre tenha esperança de que algo assim vá acontecer, a gente nunca acredita quando acontece! Mas é muito bom saber que nosso trabalho está sendo visto e reconhecido!”, comemoram.