Psicose é, sem dúvida, um dos filmes de maior impacto estético na história do cinema. Ao mesmo tempo, é um clássico margeado de mistérios e segredos, ou seja, está sempre guardado por todos os que assistem como algo íntimo, pessoal, preservado para que todos tenham o mesmo frescor do impacto ao assisti-lo pela primeira vez. A mais famosa cena do cinema, o assassinato no chuveiro de Janet Leigh, ainda é celebrada como um dos maiores acontecimentos da sétima arte. Assistir Psicose, em certa medida, é perder a virgindade em relação ao cinema.
Hitchcock (2012) filme de Sacha Gervasi, baseado no livro “Alfred Hitchcock And The Making Of Psycho” de Stephen Rebello, busca recompor o frescor do mito em torno do famoso diretor de suspense, ao mesmo tempo em que tenta trazer o ambiente de criação do famoso filme desde sua concepção até a sua “opening night”. Se, por um lado, a obra de Gervasi é frágil para o tamanho de Hitchcock ou Psicose, a obra não deixa de ser uma bela citação ao cinema, como um apêndice em relação à história de Hollywood que jamais premiou o diretor com um Oscar. Interessante reparar que o Hitchcock de Gervasi também continuou ignorado pela Academia que lhe deu apenas o singelo prêmio de Melhor Maquiagem.
O que surpreende no filme é a exatidão nas paráfrases que se fazem do diretor. Anthony Hopkins, em uma excelente interpretação, consegue realizar a difícil tarefa de fazer um Hitchcock que não seja Hitchcock demais, ou seja, que não vista a personagem criada em torno do diretor, cheio dos vícios e manias e dos silenciosos olhares de suspense. Hopkins, em certa medida, humaniza essa figura dando-lhe alguma densidade, muito embora não haja muito espaço para tal uma vez que o roteiro é mais um daqueles que gira em torno do esforço e percalços para obtenção de um objetivo, no caso a produção do filme.
O que fica evidente, no fim das contas, é como que a sensibilidade de um grande pensador e criador de mundos consegue alcançar com sua ampla visão algo que até então parecia obscuro para o olhar da maioria, como se o gesto do gênio estivesse o tempo todo à sombra no nosso tempo. Uma vez apontado o caminho, os outros que margeiam, no caso Alma Reville (Helen Mirren), sua esposa, tem a incumbência de dar os retoques finais naquilo que nem o próprio criador conseguiu abarcar, como por exemplo, a escolha da célebre canção na clássica cena do chuveiro.
Que Hitchcock foi um dos maiores diretores do cinema é a própria história quem diz e creio que, para quem quer entrar no universo do autor, Hitchcock, o filme, é uma bela porta de entrada. A obra, que prima pela metalinguagem e atravessa o olhar do espectador diretamente para dentro do universo da arte, é uma verdadeira homenagem ao cinema e desvenda mundos reabrindo acessos para uma estrada que muitos de nós ainda deveria percorrer.
“Hitchcock” está em cartaz no Top Cine Hipershopping ABC, com sessões às 16h50 e 20h50. A classificação é 12 anos.
Luiz Antonio Ribeiro é dramaturgo e poeta, formado em Teoria do Teatro pela UNIRIO – Univesidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, onde atualmente cursa Letras – Português/Literaturas.