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Oblivion – Pastiche de Si Próprio

Uma vez li uma crítica do começo do século XX, do Artur Azevedo, que dizia que a peça de teatro que ele havia assistido “havia momentos belos e inteligentes, pena que os momentos belos não eram inteligentes e os momentos inteligentes não eram belos”. Parafraseio o crítico para dizer o mesmo sobre Oblivion, acrescentando que o filme é uma ficção científica onde a ficção não é científica e a ciência não é ficcional.

Chega a me impressionar certa autofagia do cinema americano, que come a si próprio e repete as mesmas histórias, passeando por diversos gêneros, achando que o espectador desatento não vai perceber. Conto a sinopse: Jack Harper (Tom Cruise) é um sujeito encarregado de fazer uma varredura na terra, em busca de recursos vitais, depois de algumas décadas de guerra com uma missão chamada Scavs. Um dia, ele resgata uma sobrevivente que hiberna em uma máquina (Olga Kurylenko) e a partir daí, começa a questionar toda sua história.

Oblivion é uma colagem de diversos filmes. Tom Cruise é uma versão de Wall-E (2008) humano, com direito a achar plantinhas na terra e tudo. Morgan Freeman é uma espécie de Morpheus do Matrix (1999), e o grande vilão é um computador com uma luz vermelha, e só. Ah, e os ETs, que causaram a guerra, são na verdade humanos.

E não se tratam de spoilers, o gênero da ficção científica está repleto dessas fórmulas e chavões, inclusive nos fazendo pensar em que medida seria possível pensar no gênero sem que se repense também no que ele se tornou, porque o que me parece, é que ele entra em declínio, na medida em que cada obra se torna apenas uma versão piorada da anterior, sem qualquer vitalidade e cada vez mais, dependendo do esforço dos efeitos visuais para sobreviver.

Chego a pensar nesse enfraquecimento do gênero, porque em alguns momentos, Oblivion chega a lembrar à novela Kubanacan, em que o herói Esteban, interpretado por Marcos Pasquim, era ao mesmo tempo três: ele, ele mesmo voltando no tempo pra salvar o mundo e um outro alter-ego malvado. Ou seja, a formação de duplos, triplos, clones de robôs estão desgastadas e mais que assimiladas pelo público comum, o que faz com que as produções já não consigam passar aquela sensação de fragmentação do sujeito, como nos contos de Poe do fim do século XIX.

Creio que Oblivion não consegue deixar de ser um pastiche de si próprio, e apesar da trilha sonora e fotografia monumentais, além da sempre eficiente interpretação de Cruise e Freeman, o filme não consegue se sustentar. Como repetição tem sua autonomia comprometida e não convence. Além do mais, o medo apocalíptico americano, que no risco de ser ele próprio o vilão do mundo, repete o fim de si próprio repetidamente, chega a ultrapassar o limite do verossímil. Assistir Oblivion talvez seja um exercício obrigatório àqueles que gostam de cinema, justamente para perceber como de geração em geração, se não tornarmos cuidado, vamos perder o fio da meada.

O filme está em cartaz no Top Cine Hipershopping ABC com sessões às 18h05 (de 26 a 30/4) e às 17h (1º e 2/5). A classificação é 10 anos.

Luiz Antonio Ribeiro é dramaturgo e poeta, formado em Teoria do Teatro pela UNIRIO – Univesidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, onde atualmente cursa Letras – Português/Literaturas.

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